Imagem: Evil Dead Rise, Warner Bros.
Era noite. Correndo pelas ruas de uma cidade fictícia do interior dos Estados Unidos, a final girl tenta ser mais inteligente do que seu algoz — que já dizimara mais da metade dos seus amigos. Ele está munido de faca ou serra-elétrica ou machado e pode ser até uma espécie de demônio. A verdade é que as opções são muitas. No fim, a final girl se salva e uma sequência está garantida para chegar ao cinema mais próximo da sua casa no ano seguinte.
Apesar de ser um evento tradicionalmente americano, o Halloween já se faz presente no calendário dos brasileiros, com marcas promovendo festas, artistas nacionais investindo em fantasias e personagens prontos para se firmarem como ícones da cultura pop moderna. No entanto, é interessante observar que, apesar de o Dia das Bruxas ser uma oportunidade para produtores e distribuidores de conteúdo audiovisual promoverem as suas intellectual properties (IPs ou propriedades intelectuais) de terror, o gênero já encontrou um público cativo nos cinemas brasileiros, mantendo-se relevante ao longo de todo o ano.
A demanda é uma métrica poderosa para entender o sucesso desses títulos. Ao ir além das métricas tradicionais, a demanda engloba o consumo de buscas online, redes sociais, consumo em sites de vídeos e em plataformas open-streaming. Através dessa metodologia, é possível mapear toda a jornada de descoberta de um conteúdo, identificando como os filmes de terror se destacam na economia de atenção.
Considerando apenas os lançamentos com janela nos cinemas, essas produções garantiram presença cativa entre os vinte filmes de maior demanda no mercado brasileiro este ano. Em média, ao menos um a cada cinco filmes de maior demanda pertenciam ao gênero de terror. Esse patamar era ainda mais relevante ao longo dos dois primeiros trimestres do ano, mas com a chegada de julho, grandes blockbusters como Barbie, Oppenheimer e Homem Aranha: Através do Aranhaverso tomaram conta dos cinemas e o gênero perdeu força, mas sem nunca desaparecer entre os destaques do ranking.
PRINCIPAIS DESTAQUES DE 2023
Com orçamento modesto comparado a outras grandes produções cinematográficas, diferentes filmes de terror não tiveram problema em alcançar o break-even, como foi o caso de M3gan, o primeiro sucesso do gênero este ano. Lançada em janeiro, a história da boneca assassina contou com campanha de marketing viral e conquistou US$ 30 milhões no mercado americano durante o final de semana de estreia, faturamento duas vezes maior do que o seu orçamento estimado. Considerando a média dos 45 primeiros dias de exibição, o filme alcança a segunda posição entre os títulos de horror mais demandados do ano no mercado brasileiro.
É interessante observar a variedade das produções deste ranking, que conta com franquias de sucesso pré-estabelecidas e produções independentes. Se, nos últimos anos, franquias clássicas foram revisitadas e novas foram estabelecidas, 2023 tem A Morte do Demônio, Invocação do Mal (representado por A Freira 2) e Pânico como IPs de sucesso — com seus respectivos novos filmes alcançando o top 5 entre as produções de horror de maior demanda no Brasil. Além desses títulos, produções lançadas recentemente no cinema têm o potencial para revitalizar franquias, como é o caso de Jogos Mortais 10, ou até mesmo estabelecer um novo universo cinematográfico de sucesso comercial, como Five Nights at Freddys.
Por outro lado, títulos independentes podem ajudar na construção da identidade de um selo, como é o caso de Fale Comigo, primeiro filme dirigido por Danny e Michael Philippou e que também é destaque no Top 10. Adquirido pela A24 e com sequência já confirmada, a produção faz parte do aclamado catálogo da empresa, que conta com os elogiados A Bruxa, Hereditário, Midsommar, além do vencedor do Oscar de melhor filme deste ano, Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo. Dessa maneira, a marca A24 permanece promovendo discussões acaloradas que inundam as redes sociais quanto à qualidade de suas produções, além de comparações entre os seus títulos.
Apesar de ser gênero de sucesso no mercado brasileiro, há um paradoxo quando pensamos no baixo volume de títulos locais de terror. Ainda que produções nacionais tenham se destacado na última década, como é o caso de As Boas Maneiras, lançado em 2017 e vencedor do prêmio de melhor filme do Festival do Rio, o reconhecimento acaba sendo maior pela crítica especializada do que pelo grande público. No entanto, essa mesma audiência está gerando demanda acima da média, e estável, para as produções internacionais. Com o interesse nas obras de horror rendendo franquias de sucesso abraçadas pelo público brasileiro, surge a pergunta que deve ser explorada: o que falta para que a próxima final girl a vencer nas bilheterias seja uma brasileira?